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domingo, 24 de julho de 2011

Ingratidão


Foto por mim. Central Park - Voucouver, BC, Canadá. 2009.

A minha ingratidão veio do berço. Não que eu tenha aprendido com meus pais, muito menos na escola. A minha ingratidão veio, talvez, marcada no meu DNA ou soprada no meu ouvido por algum vento sobrenatural e permanecendo lá no interior do meu interior. Gosto de interpretar dessa maneira, pois não me lembro de ter aprendido a ser ingrato. E não aprendi!

Ninguém me ensinou a não gostar do que tenho e a sempre querer coisas que não tenho. Ninguém me fez não gostar do meu nariz, das minhas pernas, do meu corpo. E meu corpo é apenas comum. Olha aí!
Ninguém me ensinou a rejeitar o que é comum, só por ser comum. Ninguém me fez querer o cabelo igual ao do vizinho, muito menos querer ser o vizinho. Meu cabelo é bom e o nariz do vizinho é maior que o meu. Estranho, né?

Ninguém me ensinou a sempre reclamar de alguma coisa na minha família. É fácil ver que toda família acaba tendo praticamente os mesmos problemas, mais ou menos intensos.

Ninguém me ensinou que eu não devo valorizar as coisas que chegam facilmente. Ninguém veio me dizer que tudo que eu ganhar não terá valor. E como eu já ganhei coisa cara.

Ninguém me falou que fulano é fácil porque teve atitude suficiente para vir flertar comigo. Ninguém me falou que os amores difíceis são os que realmente valem a pena. Ninguém disse que eu teria que me apaixonar apenas por quem não me desse a mínima atenção. Tenho que confessar que as coisas simples e de fácil alcance já me concederam bastante prazer.

Ninguém me mostrou como é ser idiota. Ninguém me mostrou, realmente, como ser ingrato.

Eu nasci e cresci bem desse jeitinho. E um dia me senti extremamente confortado ao perceber que não sou um ingrato sozinho no mundo. O mundo é feito de ingratos e há ingratidão para todo lado. Oh, se há! Contudo ninguém vê. Ou melhor, todos fingem não ver. Porque, contraditoriamente, fomos todos ensinados que ingratidão é ruim e feio. Então, que ela não exista! Ainda que existindo implicitamente.

5 comentários:

  1. Por mais que aprender com a dor seja um aprendizado ruim ele nos faz ter a certeza de todo o processo, que vai do pensamento à prática.
    P.s. Um bom de um poeta é fazer com que seus leitores se vejam em suas palavras. Me vi agora nestas poucas linhas. ;)

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  2. Ótimo texto!
    Gostei muito de suas colocações.
    Sim sou ingrato mas não posso dizer que não virei no seu blog outras vezes pq estarei mentindo. Não precisa me dizer...
    Eu volto sempre

    http://kayranyiuckata.blogspot.com/

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  3. Mais um texto bacanudo !
    Plagiando o George "... fazer com que seus leitores se vejam em suas palavras.." !
    :-)
    Continue nos brindando com seus textos!! :-)

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