Certo dia, decidi ser responsável e fazer alguma coisa da vida que rendesse dinheiro. Com isso, nasceu a necessidade de ter que acordar cedo. Algum infeliz inventou a frase "Deus ajuda quem cedo madruga" e ela agora começava a fazer sentido na minha vida, ou pelo menos tentava fazer. "Deus, por favor, me ajuda mesmo!"
Lá fui eu, lindo e alegre (só que não), tentar aprender a programar os meus horários e ter hora para dormir. Só que para isso, precisaria de um despertador, porque força de vontade não havia suficiente. Minha carteirinha de dorminhoco era vitalícia. Peguei o celular e programei o alarme, de lá mesmo, para tocar às 6:30 da matina, já sabendo que ensaiaria levantar e ficaria nessa até às 7:00. "Estratégia, meu filho! Ela é útil nessas horas também." Escolhi a música mais agradável que tinha na memória do celular e mandei bala.
Como previa, não consegui dormir cedo no dia anterior, porém a ansiedade pelo novo e o medo de causar má impressão no primeiro dia de trabalho, me fizeram levantar na hora com tranquilidade. Quer dizer, depois de acordar várias vezes durante a noite acreditando estar atrasado. Os dias seguintes seguiram mais ou menos da mesma forma, mas fui, aos poucos, acumulando sono pra dormir mais cedo. A primeira semana foi até tranquila.
No primeiro dia da terceira semana, começaram as falhas na estratégia... O desesperador, digo, despertador, tocou na hora e fui usando a função "soneca" de 5 minutos até não poder mais. Consequentemente, passei a aceitar a ideia de me atrasar um pouco. Um pouquinho só! Durante vários dias, mantive a linha alarme-soneca-alarme atrasando na média normalíssima de 10 minutos.
Passados alguns meses, eu já tinha certeza que o emprego era meu, o que trazia um conforto maior durante o sono. Ou seja, desastre. O despertador tocava e eu não mais ouvia e, quando ouvia, desligava sem nem notar. Acordava atrasado desejando uma morte súbita para que eu não precisasse sair da cama. Passei a ter um amor incondicional pela minha cama. Os minutos de atraso começavam, assim, a crescer exponencialmente. E chegara a hora de bolar uma nova estratégia.
Fui atrás de um novo despertador. Comprei um daqueles irritantes com som de bip. Assim, o alarme do celular continuava programado para a mesma hora, 6:30. E o de bip irritante coloquei às 6:50 e bem distante de mim, para eu ter que sair da cama para desligá-lo. Na altura do campeonato, eu odiava aquele toque do celular com todas as minhas forças. Contudo, não adiantava mudá-lo, pois também odiaria os próximos, com absoluta certeza. A estratégia, afinal de contas, estava renovada e os dias seguiram mais (in)felizes. Comecei a torcer que aquela perdurasse dessa vez. E perdurou, com a benção divina.
Certo dia, estava eu na casa de um amigo, com várias outras pessoas e, repentinamente, o celular de alguém começou a tocar com o MEU toque do alarme. Na mesma hora, o que era alegria virou sensação ruim de desespero. Vontade de encontrar o celular e destruí-lo, e dar um soco no dono. Naquele momento, eu tive a certeza que odiaria aquela música o resto da minha vida.